Por Carrie La Jeunesse, MyEVT
Talvez em nenhum outro campo da medicina a morte seja uma ocorrência tão frequente, natural e esperada como na clínica de animais de companhia.
O tempo de vida relativamente curto de nossos pacientes, frequência de atendimento de enfermidades ou ferimentos de gravidade, e limitações situacionais e financeiras de proprietários resultam na morte, convalescença, e luto tornarem-se relativamente comuns. Perder pacientes e testemunhar o distress emocional de clientes pode certamente afetar a todos nós como provedores de saúde veterinária, mas o impacto que a perda (ou perda iminente) de um animal tem em proprietários e famílias pode acabar sendo mal compreendido ou minimizado não-intencionalmente.
tanatologia, substantivo
1. O estudo da morte, convalescença e luto.
O que pensamos, falamos e fazemos pode ter um impacto de longa duração, tanto de maneira positiva como negativa, no processo de enlutamento de nossos clientes, assim como para nós mesmos e nossos colegas. O quanto precisamos saber de teorias validadas de tanatologia? Como continuarmos fiéis às nossas crenças e valores apoiando clientes e colegas que possam estar lutando? Como abordarmos situações tão sensíveis e carregadas emocionalmente, de forma a prover uma extensão gentil do cuidado médico que já oferecemos?
Nosso próprio conforto com a morte, nossas experiências prévias com a perda, nossas estratégias pessoais e sistemas de suporte para lidar com a situação, e nossos modelos de compreensão para o pesar e o lamentar (leia Morte, Convalescença e Enlutamento: Conceitos Básicos) influenciam o que demonstramos a clientes durante a morte de um animal. No entanto, o que é útil para nós quando passamos por uma perda pode ser contraproducente se projetado em outra pessoa. É frequentemente difícil estar “presente” nas emoções intensas de outras pessoas. Queremos aliviar o sofrimento. Contudo, clientes frequentemente dirão o que precisam, se pudermos por de lado nossas expectativas, gerar confiança e estabelecer um ambiente seguro e acolhedor.
Defina Pesar e Lamentar
Experiências de pesar e lamentação são altamente individuais. O dicionário Encarta define perda como “o fato de não ter mais algo, ou ter menos de algo.” Essa definição identifica de maneira simples e elegante as bases das reações específicas e singulares ao luto. Na morte, coisas que foram um dia, coisas de valor, são irremediavelmente perdidas. É a natureza de uma perda em particular (relacionamento, apego e sentimentos semelhantes, circunstâncias da morte) e uma multiplicidade de fatores pessoais (idade, maturidade, diversos mediadores pessoais/históricos/sociais, e alterações concomitantes ou concorrentes, estilo de luto) que impactam experiências de pesar e o processo de luto(1).
A cultura influencia como indivíduos e famílias abordam a morte e tomadas de decisão associadas, mas há ampla individualidade dentro de um mesmo grupo. Simplesmente perceber isso e perguntar, “como você e sua família gostariam que apoiássemos você?” ou “o que você gostaria que eu soubesse sobre o que é importante para você e sua família ao trabalharmos com a doença/ferimento/morte de Jessie?” é útil. Não se preocupe se os clientes não souberem. Você ofereceu muito, entretanto, ao deixar clara a sua disponibilidade, disposição de escutar e comprometimento de “estar presente” durante o processo.
Jogue Fora o Roteiro
Pesar e luto não se manifestam em estágios específicos, nem seguem trajetórias específicas ou lineares. Modelos comumente usados como referência para o pesar e luto que são baseados em estágios, ou indicam uma trajetória linear (ex. negação, raiva, barganha, depressão, aceitação) não resistiram ao escrutínio científico. Referir-se a tais modelos pode causar confusão e distress desnecessário quando o “roteiro” que oferecemos não reflete o que os clientes estão de fato vivenciando, e pode levar a preocupações de que eles não estão enlutados da maneira “certa”, ou que há talvez algo de errado com eles por terem reações diferentes ao modelo.
Dois modelos são notáveis pelo reconhecimento dos processos e resultados do pesar. A Construção de Significado mostra que “emoções positivas” frequentemente desenvolvem-se em sequência a perdas significativas, quando os enlutados conseguem tirar sentido da perda e finalmente identificar algum benefício(2). De forma semelhante, o Modelo do Processo Dualista de Reação ao Luto mostra que o processo de luto oscila entre a experiência de perda (impacto da morte) e a experiência de recuperação (estabelecer uma nova vida redefinida pela realidade da perda)(3).
Chama-se “Trabalho de Luto” Porque É Trabalho
O ajuste bem-sucedido à perda de um ente querido é realizado pelo trabalho das Tarefas de Luto, como identificado por Willian Worden(4):
- Tarefa I: Aceitar a realidade da perda
- Tarefa II: Trabalhar através da dor do luto
- Tarefa III: Ajustar-se a um ambiente onde o falecido ausenta-se
- Tarefa IV: Realocar emocionalmente o falecido e continuar com a vida
Apesar da terminologia parecer indicar um processo em estágios, a realização dessas tarefas é fluida e flutuante, e depende, naturalmente, de primeiro aceitar que a morte ocorreu. Diferentes tarefas podem ser trabalhadas simultaneamente, ou separadamente. Eventualmente, o apego ao falecido é redefinido no contexto da sua ausência na vida do enlutado.
Reconheça a Importância da Perda
A perda de um animal de estimação pode ser a perda mais significativa experimentada por algumas pessoas. Pode ser difícil para alguns compreenderem, especialmente aqueles que não possuem animais mas que sofreram uma perda agonizante de um amigou ou membro da família, mas não deixa de ser verdadeiro. Clientes frequentemente encontram-se em choque, e sentem vergonha e contrangimento quando a lamentação pela morte de um animal é mais difícil do que a perda de mesmo um pai, esposo ou filho. Perder a conexão com nossos animais – a aprovação completa de quem somos, o amor aparentemente incondicional, a presença silenciosa em tempos difíceis – pode afetar-nos nos níveis psicoemocionais mais profundos e elementares.
Há reconhecimento insuficiente do impacto da morte de um animal de estimação em membros da família. Simplesmente reconhecer e validar a severidade da perda como ela é vivenciada pode ser o maior presente dado a clientes após a morte de seus animais.
A verdade do outro não é a nossa. Nunca poderemos compreender integralmente tudo o que contribui para o pesar de um dado indivíduo, parcialmente porque o luto é revisitado e altera-se com o tempo. Mas através da escuta compassiva, alguma compreensão de teorias válidas de luto, e familiaridade com nossas próprias visões sobre a morte, podemos formar uma abordagem pessoal adequadamente informada. Podemos continuar sinceros a nós mesmos, e como nos relacionamos individualmente com clientes e outros que nos importam. Dessa maneira, promovemos apoio e compreensão em outros, em nós mesmos e dentro de nossas comunidades.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. MARTIN, T.; DOKA, K.J. Men Don’t Cry, Women Do: Transcending Gender Stereotypes of Grief. Philadelphia: Taylor and Francis, 1999.
2. NEIMEYER, R.A. Meaning Reconstruction and the Experience of Loss. Washington, DC: American Psychological Association, 2000.
3. STROEBE, M.; SCHUT, H. The dual process model of coping with bereavement: rationale and description. Death Studies 23(3):197- 224, 1999.
4. WORDEN, J.W. Grief Counseling and Grief Therapy. 3 ed. New York: Springer Publishing, 2002.
Traduzido e adaptado de My Exceptional Veterinary Team.
O trabalho de um médico veterinário envolve também o bem-estar do seu cliente humano, e o apoio em um momento difícil pode ser decisivo para cultivar uma relação a longo prazo com seu cliente.
Sucesso!
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